29 de maio de 2005

as asas da inocência

Serão as asas que fazem os anjos? Serão as asas?
Sabemos que o ónus do corpo, mesmo disfarçado pela leveza da túnica, impede definitivamente o voo. Mas isso que importa, se a tarde é de festa e os rostos se iluminam de sorrisos?
Sim! De penas, de tule ou de cetim, são as asas que fazem os anjos. Porque, aos meninos, o que lhes falta em divindade, sobra-lhes em inocência.


ao colo da mãe -
o anjo da procissão
não pode voar

as asas que tem nas costas
são de tule e de cetim

24 de maio de 2005

enche o vento de sentenças
quem se quer poeta à força

bem o sabe a lagartixa
que goza o sol sobre as pedras

- a verdade do poema
está para além das palavras

15 de maio de 2005

a urgência das palavras
desassossega a carne

encurralada
entre a opacidade dos dias
e a vertigem da morte

- no íntimo labor dos dedos
escrever é já

11 de maio de 2005

bandeiras de fumo

Vistosa como um paroquiano endomingado, a chaminé domina o horizonte dos telhados. Erecta e vigilante, desafia as intempéries, entre a alvura da cal e a negrura da fuligem. Agita no ar suas bandeiras de fumo, ignorando o turbilhão do vento que logo as dispersa. Como se gritasse na sua teimosia: Ouviram? Aqui vive gente.

bandeiras de fumo
agitam-se num turbilhão
incensando os ares

sobre os telhados da aldeia
o grito das chaminés

10 de maio de 2005

bando de gaivotas
rasgando o nevoeiro

adejam as palavras
sobre o oceano
do poema