12 de julho de 2005

tal como a água
as palavras nunca dormem -

uma árvore de fogo
ilumina o bojo nocturno da boca

e atraiçoa a transparência líquida
do verbo

insinuando o rigor marmóreo
do silêncio

o sono jamais

9 de julho de 2005

uma estranha calma
se apodera da cidade

cerzindo a dor dos vivos
e o olhar pasmado dos mortos

lenta
lentamente

das palavras sufocadas
germina um novo poema

feito com as lágrimas
que não souberam chorar

8 de julho de 2005

entardecem as palavras
se o sangue
lhes é indiferente

murmúrio oco
embalando as consciências

cegueira consentida
ignorando o pesadelo:

a cidade das promessas por cumprir
continua
trucidando inocentes

7 de julho de 2005

amanheceu o sangue

Londres07jul05.jpg

amanheceu o sangue
no coração da cidade cosmopolita

como ontem amanheceu
nos campos da Palestina

como amanhece sempre
em todos os sítios do mundo
onde a insanidade humana
faz explodir bombas
em vez de florir pão

se o cenário muda
a dor é a mesma

e a morte
igualmente estúpida
igualmente cega

6 de julho de 2005

noite sem luar

só o aroma da fruta
habita o pomar

3 de julho de 2005

Metáforas do corpo

palco.jpg
FOTO: Carlos Fernandes

O palco acolhe sempre com agrado as metáforas do corpo. Desenrolam-se sobre as tábuas os factos imaginados que os gestos tornam reais: o amor e o ódio, a lealdade e a traição, o nascimento e a morte, o riso e as lágrimas. Tudo se revela naquele rectângulo escuro, como se o mundo dos homens coubesse inteiro numa caixa. Depois, aturdido ainda pelo eco das palmas, o estrado vazio aguarda em silêncio pelo quente palpitar das palavras.

revela-se o homem
numa vida imaginada
sobre o tabuado

em toda a sua grandeza
em toda a sua miséria