19 de dezembro de 2004

a nostalgia dos poetas

(uma homenagem à lusofonia)

a nostalgia dos poetas
enche de ocultos sentidos
a língua que falo
a língua que falas

debatem-se os poetas
com as palavras que os habitam
escondidas debaixo da pele
como animais domésticos
à espera de um afago

e penteiam-nas meticulosamente
com o metal dos aparos
nesse delicado compromisso
entre o amargor da tinta
e a limpidez opaca do papel

folheiam
com os dedos manchados de azul
uma gramática ancestral
herdada da secreta errância dos povos
entre a dor e a alegria

e trazem na alma a compaixão
pelas difíceis coisas simples
que o sangue esconde
e a noite cala

acorrentados à sua impossível condição
nas brumosas masmorras deste país
que ao nascer da aurora se faz verde
e negro se torna ao poente de tanto esperar
todos os dias resistem os poetas
contra o medo e o olvido

e as palavras
libertas do seu quotidiano jugo
enchem o peito dorido dos poetas de desejo
de um destino para além da história

é o amor dos poetas pelas palavras
que torna possível
que as fronteiras desta pátria
se estendam entre a minha
e a tua língua

e que um dia o nosso abraço
se encontre
dos dois lados deste mar

1 comentário:

  1. " A minha pátria é a lingua portuguesa ".
    Beijos e boas festas, Carlos Alberto.

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